Bem Doida!

segunda-feira, janeiro 06, 2003

Como a gente tem jogado pedras neles, acho que vou postar este e-mail que recebi:

A primeira festa de aniversário de Mano Wladimir
Por Vladimir Cunha
vlad@onmail.com.br

Mano Wladimir está tenso. No colo da mãe, Marisa Monte, ele ainda não
conseguiu entender exatamente o que está se passando. Ao seu lado,
Carlinhos Brown conversa com Wally Salomão, que cita uma poesia de
Caetano Veloso, que dá um brigadeiro orgânico (sem chocolate e sem
leite condensado) para Zeca, que leva um pito da mãe, Paula Lavigne.
Mano Wladimir está tenso. É a sua primeira festa de aniversário.

"Criança sã/De uma rã/Guardiã/Eu sou seu fã/Na manhã/Aramaçã/Cunhã".
A música infantil escrita por Arnaldo Antunes especialmente para a
festa é a trilha sonora da dança das cadeiras. Nada da Turma da
Mônica, nada de atores desempregados vestidos de Pikachu. Aqui a
coisa é diferente. MM resolveu ser mãe em grande estilo e contratou a
Companhia Bufa de Artes e Performances do Absurdo para animar a
festa. Fantasiado de Ed Motta, um ator recita de trás para a frente
toda a obra de Eça de Queiroz para algumas crianças. Do outro lado da
sala, um grupo de clowns (sim, porque numa festa como essa é proibido
ter palhaço) ensaia uma volta à posição fetal enquanto ostenta
reproduções dos parangolés de Hélio Oiticica. Num canto, Carlinhos
Brown dá uma entrevista para uma repórter da revista Bravo, escalada
especialmente para cobrir o evento.

- E aí, Brown? Está feliz com o primeiro aninho do Mano Wladimir?
- É uma coisa da modernidade nagô, no que tange a referência
espaço/tempo do ciclo da história humana. O cósmico supremo da
realização superlativa, a poética da bioenergia enquanto motor da
sublimação ótica. É onde o eu e o tu fundem-se na epiderme
inconsciente.
- E o que você deu de presente para ele?
- Pensei na questão do pacifismo, na guerra como catalisador das
emoções humanas ao mesmo tempo em que atrai e repudia o ser. A
máquina ceifadora que gera vibrações orgônicas, que tangencia e
descontinua a unidade solar dos povos.
- Como assim?
- Eu dei um boneco dos Comandos em Ação...

Enquanto as crianças não podem comer o bolo de cenoura, aniz e mel de
cana - que traz estampado uma reprodução de O Abaporu, de Tarsila do
Amaral, em sua cobertura - Marisa Monte serve a elas copos de suco de
gengibre e balas de cravo da Índia. Até que Paula Lavigne tem a idéia
de chamá-las para um karaokê.

Quem começa a brincadeira é Benedito Tutankamon Pedro Baby, cinco
anos e filho de um dos roadies de Arnaldo Antunes, que canta O
Avarandado do Amanhecer, de Caetano Veloso. Em seguida é a vez de
Zabelê Tucumã Nhenhé Çairã, três anos e filha da empresária de
Carlinhos Brown, que canta Ana de Amsterdã, de Chico Buarque. Ao
saber que a próxima criança a cantar é a impronunciável Zadhe Akham
Mahalubé Sinosukarnopatrionitnafilewathua, filha da copeira de Marisa
Monte, Paula Lavigne acha melhor suspender o karaokê.

É hora do Parabéns a Você. Os convidados reúnem-se em torno da mesa.
E então, Marisa Monte anuncia uma surpresa: quem irá cantar o
Parabéns é Carlinhos Brown.

Brown, que andava meio sumido depois de sua entrevista para a Bravo,
aparece vestido com um cocar feito de canudinhos de plástico, uma
camisa de jornal e uma tanga de folhas de bananeira. Atrás dele, 315
percussionistas da Timbalada, um videomaker e quatro poetas
marginais. Brown pega um garrafão de água mineral e começa a cantar
sua versão para Parabéns a Você:

- Vim para cantar/A tropicália alegria de um povo/Azul, badauê,
zumbi/Ela não me quer/Mas sou um tacle regueiro/Viva o divino samba
de João/Monarco na rua/Meu bloco chegou.

Arnaldo Antunes se empolga e começa a recitar poesias
descontroladamente, Marisa Monte gorgeia e improvisa algumas
melodias, a Timbalada toca um samba-reggae, Paula Lavigne cai na
farra e Caetano acha tudo "lindo". O videomaker filma tudo e Wally
Salomão escreve o release. Os poetas marginais aproveitam a confusão
para roubar uns docinhos.

Um executivo de uma grande gravadora, que entrou de penetra, contrata
todos os presentes e promete CD, DVD, livro, críticas favoráveis no
New York Times, participação de David Byrne e especial de televisão.
Para comemorar, Arnaldo Antunes põe um disco de Lupicínio Rodrigues.
O ator vestido de Ed Motta cospe fogo. Marisa Monte lê Mário Quintana
em voz alta. Mano Wladimir chora. É a sua primeira festa de
aniversário.